Derecho y Cambio Social

 
 

 

 

NOTAS SOBRE O AGRAVO NO PROCESSO CIVIL

Julio Pinheiro Faro Homem de Siqueira *


 

 

 

 

1. FINALIDADE, CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA

O agravo é o recurso cabível contra as decisões interlocutórias proferidas em qualquer fase do procedimento e tem por finalidade precípua evitar a preclusão quanto à matéria decidida incidentalmente, isto é, tem por escopo evitar a preclusão de decisões interlocutórias.

É cabível mesmo após a sentença, como no caso de cumprimento de sentença (art. 475-M, CPC) e de liquidação (art. 475-H, CPC). De se observar, também, que há decisões interlocutórias irrecorríveis:

ü      Decisão que releva pena de deserção, quando tenha o apelante provado justo impedimento para não ter efetuado o preparo do apelo (art. 519, parágrafo único, CPC);

ü      Decisão do juiz que recebe a apelação;

ü      Decisões interlocutórias no juizado especial;

“Tanto nas ações reguladas pelo CPC, quanto naquelas previstas em leis especiais, é, em regra, admissível agravo contra as decisões interlocutórias, a não ser que a lei disponha em sentido diverso. O CPC, ao registrar os atos irrecorríveis, normalmente o faz apenas em relação a pronunciamentos que, em princípio, consistem em despachos, e não em decisões interlocutórias (cf. arts. 482, parágrafo 3º; 519, parágrafo único; 543, parágrafos 2º e 3º). O art. 527, parágrafo único, recentemente alterado pela Lei 11.187/2005, dispõe que, contra a decisão do relator, que determina a conversão do agravo de instrumento em agravo retido e concede ou não efeito suspensivo ou antecipação dos efeitos da tutela recursal, “somente é passível de reforma no momento do julgamento do agravo, salvo se o próprio relator a reconsiderar” (ARRUDA ALVIM WAMBIER, 2006, p. 136).

Há que se fazer duas observações iniciais. A primeira se refere ao conceito de decisão interlocutória, o qual é dado pelos parágrafos segundo e primeiro (este a contrario sensu) do artigo 162 do CPC: ato processual do juiz que, no curso do processo, resolve questão incidente, e que não pode estar nos róis dos artigos 267 e 269 do CPC. A segunda se refere ao caráter da matéria incidental, a qual pode, ou não, ser de ordem pública, ou seja, se a questão incidental for de ordem pública não há que se falar em preclusão, de modo que o agravo pode ser interposto a qualquer tempo; observe-se que a qualquer tempo não quer dizer prazo ad infinitum.

Lembre-se que apenas aquela decisão interlocutória em que o juiz decide alguma questão incidental é que é agravável, ou seja, se o juízo a quo não decidiu qualquer questão incidental, esta será levada a reboque, pela apelação, ao juízo ad quem.

O prazo para a interposição dos agravos em geral é de dez dias; são exceções: o prazo do agravo interno (cinco dias); o prazo das interlocutórias proferidas em audiência (de instrução e julgamento ou preliminar – prazo é imediato); o prazo que é contado em dobro (litisconsortes com procuradores diferentes, Ministério Público, Fazenda Pública, Defensoria Pública). Quanto aos prazos, devemos volver os olhos também para a questão dos pedidos de reconsideração, prática costumeira na praxis forense, apesar da inexistência de previsão legal: o pedido de reconsideração não interrompe nem suspende o prazo de interposição do agravo.

2. PRINCIPAIS EFEITOS

O agravo apresenta os seguintes principais efeitos: obstativo, devolutivo, regressivo, suspensivo e ativo. Estes dois últimos, observe, são próprios do agravo de instrumento, enquanto que os dois primeiros são atinentes a todos os tipos de agravo.

A doutrina é unânime em afirmar que a devolução é um efeito essencial aos recursos. Escreve Teresa Arruda Alvim Wambier (2006, p. 333) que a devolução consiste em se submeter decisão impugnada novamente ao juízo do Judiciário, reexame este a ser feito, de regra por outro órgão e, excepcionalmente, pelo mesmo órgão. Assim, o agravo devolve ao tribunal a matéria nele impugnada, ou seja, de regra o tribunal aprecia, ao conhecer do recurso, tão-só o que consta das razões do agravo (a regra é de que é devolvido o que é agravado).

Questiona-se pela possibilidade de haver processo sem sentença em que tenha havido a interposição de agravo. Por exemplo: o juízo a quo indefere o pedido de antecipação de tutela no curso do processo de conhecimento, de modo que o autor agrava tal decisão, devolvendo a matéria ao juízo ad quem; o tribunal, reconhecendo o objeto do agravo, profere acórdão, e, ao invés de remeter os autos ao juízo a quo para que este conceda a tutela antecipada, pode, aplicando analogicamente o parágrafo terceiro do artigo 515, conceder, ex officio, a tutela antecipada.

O efeito regressivo, consistente no juízo de retratação, é efeito indissociável do recurso de agravo e “permanece até hoje como um dos aspectos mais relevantes desse recurso, já que a reconsideração da decisão é admitida em todos os tipos de agravo” (ORIONE NETO, 2006, p. 302). Assim, o magistrado só poderá, a nosso ver, retratar-se, quando o fizer antes de praticar atos processuais os quais sejam incompatíveis com o juízo de retratação.

Teresa Arruda Alvim Wambier (2006, p. 332), com base na lição de Alcides de Mendonça Lima, explica que o efeito suspensivo “não integra a essência dos recursos, não os caracteriza como tais, porque se pode conceber o recurso sem pensar no efeito suspensivo, enquanto que não há recurso sem efeito devolutivo”.

O efeito suspensivo é próprio do agravo de instrumento interposto contra decisão interlocutória positiva, a fim de retirar a eficácia da decisão dada, de forma que se retorna ao statu quo ante. “Hoje, o critério para a concessão de efeito suspensivo ao agravo de instrumento é o perigo de que da eficácia da decisão impugnada decorram danos graves e de difícil reparação para o recorrente, sendo relevante o fundamento do recurso. A lei alude a alguns casos, como se disse, apenas a título exemplificativo” (ARRUDA ALVIM WAMBIER, 2006, p. 352).

O efeito ativo é próprio do agravo de instrumento interposto contra decisão interlocutória negativa, de forma a antecipar a tutela recursal.

A doutrina tem entendido que se considerarmos que o efeito suspensivo só será dado se a parte o requerer, o mesmo deve ser aplicado ao efeito ativo; caso contrário, ou seja, se quisermos que o efeito ativo não dependa de requerimento da parte, teremos de considerar que o efeito suspensivo também pode ser dado de ofício pelo juízo.

3. FORMA DE INTERPOSIÇÃO DO AGRAVO: RETIDO NOS AUTOS

A Lei 11.187/05 colocou como regra de interposição o agravo retido e isso fica muito claro quando observamos a redação do caput do artigo 522, o qual se vale do termo salvo para destacar que o cabimento do agravo de instrumento é excepcional. Assim, as hipóteses de cabimento do agravo retido são conhecidas a contrario sensu, ou seja: quando não puder advir da decisão dano grave de difícil reparação; quando a decisão receber a apelação; quando a decisão não declarar os efeitos em que a apelação é recebida.

É o procedimento mais simples no que tange aos recursos cíveis. O juiz a quo não emite qualquer juízo de admissibilidade, e sim, e apenas, o Tribunal de Justiça. Como se pode depreender da leitura do art. 523 do CPC: o agravo retido, “uma vez interposto, deverá ficar mantido nos autos, somente devendo ser processado e julgado pelo tribunal, caso não haja retratação imediata do juízo de primeiro grau e desde que a parte o reitere para que o tribunal, quando do eventual julgamento da apelação, dele conheça (CPC, art. 523). Significa que não se conhecerá do agravo se a parte não requerer expressamente, nas razões ou contra-razões da apelação, sua apreciação pelo tribunal (CPC, art. 523, parágrafo 1º)” (DIDIER JR.; CARNEIRO DA CUNHA, 2007, p. 118).

O agravo retido não está sujeito a preparo (artigo 522, parágrafo único), de modo que deve ser interposto, por petição, junto ao juízo a quo, a qual será juntada aos autos do processo, independendo de juízo de admissibilidade, abrindo-se vistas ao recorrido (parágrafo segundo do artigo 523), e, depois de este ser ouvido, o juiz poderá reformar sua decisão (juízo de retratação). Observe que não será feito juízo de admissibilidade, e isso porque, se houvesse, pululariam agravos sobre a decisão interlocutória tanto sobre o juízo positivo quanto negativo de admissibilidade.

Discute-se, também, a possibilidade de o agravo ser interposto intempestivamente. Como já foi dito, ao juízo a quo não cabe fazer análise da admissibilidade do agravo, uma vez que se o fizer, contra tal decisão caberá agravo. De tal modo, é preferível que o juiz mande intimar o agravado para, no prazo de dez dias, para oferecer contra-razões.

O agravo retido possui efeito devolutivo impróprio ou imperfeito, o qual depende de requerimento nas razões ou nas contra-razões da apelação, como questão preliminar recursal, de modo que o agravo retido será julgado antes da apelação, conforme dispõem o caput e o parágrafo primeiro do artigo 523. Aliás, o próprio agravo retido depende, para que seja conhecido, do conhecimento da apelação, quando será feito o juízo de admissibilidade do agravo retido nos autos. Assim se pronuncia Orione Neto (2006, p. 311): “o agravo retido carece, sob certo aspecto, de autonomia, uma vez que seu conhecimento está subordinado ao da apelação, que tem de existir, para que ele tenha sentido prático”.

Requer o parágrafo primeiro do artigo 523 do CPC que a parte requeira expressamente, nas razões ou na resposta da apelação, a apreciação do agravo pelo tribunal, de modo que: “a falta de reiteração do agravo retido, nas razões ou contra-razões de apelação, configura desistência tácita, jamais renúncia ao recurso, porquanto só se renuncia a um recurso ainda não interposto” (ORIONE NETO, 2006, p. 311).

4. FORMA DE INTERPOSIÇÃO DO AGRAVO: RETIDO ORAL EM AUDIÊNCIA

O parágrafo terceiro do artigo 523 regula a possibilidade de interposição oral do agravo retido contra decisão interlocutória proferida em audiência de instrução e julgamento, de modo que a doutrina diz ser possível tal tipo de agravo, chamado agravo retido oral, também em outras audiências realizadas no curso do processo, como a audiência preliminar do artigo 331. Observe-se que a possibilidade de interposição de agravo retido já existia no sistema do CPC de 1973, só que era facultativa, e, atualmente, é obrigatória (impositiva). O prazo do agravo retido oral é imediato, assim suas razões como suas contra-razões (princípio da paridade de armas), sob pena de preclusão.

Há que se enfrentar uma questão interessante: no caso de possibilidade de lesão grave e de difícil reparação, caso o agravante fique na dúvida quanto à interposição de agravo retido oral em audiência ou de agravo de instrumento, desde que tal dúvida seja fundada, deverá o agravante fazer, na própria audiência, uso do protesto. O protesto, conforme dispõe o art. 867 do CPC, tem o escopo de conservar o direito de recorrer, o que permitirá a suspensão do prazo. É preciso ficar atento ao fato de que o agravante ao entrar com o protesto não poderá interpor qualquer recurso concomitantemente, sob pena de preclusão.

5. FORMA DE INTERPOSIÇÃO DO AGRAVO: POR INSTRUMENTO

O agravo de instrumento é a modalidade de agravo que somente poderá ser utilizada por aquele que necessita obter, desde logo, o reexame de uma decisão interlocutória proferida em seu desfavor, em virtude de que os efeitos dessa decisão possam lhe causar lesão grave e de difícil reparação, daí o efeito suspensivo e o efeito ativo, ambos estudados linhas atrás.

Importante ler atentamente esta cláusula geral do agravo de instrumento, haja vista o amplo rol de aplicação da referida modalidade de agravo. Bem observam Didier Júnior e Carneiro da Cunha (2007, p. 127) que “a ‘lesão grave ou de difícil reparação’ constitui um conceito vago ou indeterminado, devendo ser definido pelas peculiaridades do caso concreto. A referência lesão grave ou de difícil reparação conduz à idéia de urgência, de sorte que as decisões que concedam ou neguem pedido de liminar ou tutela antecipada encartam-se perfeitamente na hipótese legal”. Na mesma esteira Flávio Cheim Jorge (2003, p. 175): “a urgência, portanto, passa a ser um critério fundamental, e quase sempre imprescindível, para a admissibilidade do agravo de instrumento”.

De acordo com o professor Marcelo Zenkner, em suas aulas, a doutrina aponta, em geral, quatro hipóteses para o uso do agravo de instrumento, diante da cláusula geral acima referida:

ü      Caberá agravo de instrumento quando a decisão interlocutória estiver inserida em um contexto de urgência, isto é, quando o recorrente não puder esperar a decisão final para ver reformada a decisão interlocutória a ele desfavorável. São exemplos: decisão que fixa alimentos provisórios; decisão que (in)defere liminar cautelar; decisão que (in)defere pedido de tutela antecipada, com base no art. 273, I, do CPC;

ü      Caberá agravo de instrumento quando a lei assim determinar. Por exemplo: decisão do juiz que não recebe a apelação (art. 522, in fine); decisão do juiz que indica em quais efeitos é apelação recebida (art. 522, in fine); decisão que resolve a liquidação (art. 475-H); decisão do juiz que rejeita a impugnação (art. 475-M, parágrafo 3º); decisão que receber a petição inicial no caso de ação de improbidade administrativa (art. 17, parágrafo 10, Lei 8.429/1992).

ü      Caberá agravo de instrumento quando for verificada situação de incompatibilidade do sistema processual em relação ao agravo retido. Alguns exemplos (DIDIER JR.; CARNEIRO DA CUNHA, 2007, p. 131): decisões interlocutórias proferidas em procedimento de execução (há que se fazer uma ressalva: da decisão que extinguir a execução caberá apelação, conforme o art. 475-M, parágrafo 3º); sempre que a questão decidida por decisão interlocutória for autônoma em relação à sentença, “não lhe afetando nem sendo por ela afetada”; decisões interlocutórias proferidas no juizado; decisões interlocutórias proferidas no processo trabalhista; “exclusão de litisconsorte, com condenação em verba honorária”; “indeferimento parcial da petição inicial”; “aplicação da multa do parágrafo único do art. 14 do CPC a um terceiro”; “resolução parcial do mérito da causa (art. 273, parágrafo 6º, CPC)”; decisão que punir o advogado com base no art. 196 do CPC”.

ü      Caberá agravo de instrumento quando a imposição na utilização do agravo pela via retida implicar em falta de interesse em recorrer. Por exemplo: decisão que indefere pedido preliminar.

O artigo 525, I, do CPC estabelece algumas peças que, necessária e obrigatoriamente, devem instruir a petição do agravo de instrumento, isto é, o agravante deve juntar ao seu agravo os seguintes documentos:

ü      Fotocópia da decisão interlocutória agravada, a fim de que o tribunal tenha acesso ao conteúdo da decisão que foi objeto da impugnação;

ü      Fotocópia da certidão de intimação do agravante acerca da decisão: como é o tribunal que faz análise da admissibilidade do recurso de agravo, cumprir-lhe-á que examine a tempestividade do agravo de instrumento, exame este efetuado mediante a certidão de intimação do agravante, a qual contém a data da intimação. Escrevem Didier Júnior e Carneiro da Cunha (2007, pp. 133-134) que “quanto à certidão de intimação, poderá ser dispensada, deixando de instruir o agravo de instrumento”; isso ocorrerá nos casos em que puder ou tiver sido acostado ao agravo qualquer outro elemento que evidencie a tempestividade do recurso. Contudo, de se observar que, mesmo assim, isto é, mesmo que não seja necessária fotocópia da certidão de intimação, será necessária a fotocópia de documento que permita verificar a tempestividade do agravo;

ü      Fotocópia das procurações outorgadas aos advogados do agravante e do agravado: a finalidade da presença de tais documentos é a de que o tribunal verifique a regularidade das representações feitas em juízo. Devem ser ressalvados os casos em que houver impossibilidade material de fazer fotocópias de tais peças, situações em que as procurações deverão ser juntadas antes que o relator tome conhecimento do agravo, conforme interpretação restritiva do art. 525, parágrafo 2º do CPC.

O agravante pode, facultativamente, juntar qualquer outro documento ao agravo, mesmo os que não façam parte dos autos do processo principal. Há construção jurisprudencial no sentido de que há peças que, apesar de não haver previsão legal por sua obrigatoriedade, são necessárias ao recurso de agravo, em determinados casos, para que sejam conhecidas as questões discutidas, como, por exemplo: o conhecimento de pedido liminar em ação cautelar requer que o agravante junte, à petição de seu recurso, a petição inicial ajuizada no processo principal, a fim de que o agravo seja conhecido.

Ao agravado, por força do princípio da isonomia entre as partes e da paridade de armas, conforme se depreende do artigo 527, V, do CPC, é facultada a juntada de quaisquer documentos que considerar convenientes, mesmo que estes não façam parte dos autos principais.

Quanto à regra do art. 526 do CPC, há três correntes: a) corrente declarativa (literal): interpreta o artigo conforme está positivado; b) corrente restritiva: considera que o legislador disse mais do que devia, de modo que é preciso tornar restrita a aplicação da regra do artigo: os requisitos de admissibilidade dos recursos, inclusive a regularidade formal, questões de ordem pública, não estão sujeitos à preclusão, ou seja, podem ser conhecidos de ofício pelo juiz, independentemente de provocação das partes; c) corrente ampliativa (o legislador disse menos do que queria): quando não houver qualquer prejuízo ao agravado acerca do não-cumprimento da regra do art. 526 do CPC. Interessantes os posicionamentos das correntes declarativa e ampliativa, os quais são, a seguir, apresentados.

De acordo com a interpretação que a corrente declarativa dá ao dispositivo: o art. 526 do CPC determina que o recorrente, no caso o agravante, comunique a interposição de seu recurso mediante juntada aos autos do processo de cópia da petição recursal e do rol de documentos que façam prova ao agravo. Trata-se de ato que torna oficial o registro da interposição do recurso. Como escreve José Carlos Barbosa Moreira (2006, p. 511): a finalidade de tal regra não é de dar ciência ao agravado, uma vez que este será intimado para apresentar suas contra-razões dentro do prazo de dez dias (artigo 523, parágrafo 2º, do CPC), e sim “para que o próprio juiz a quo se inteire de que sua decisão foi impugnada e, não estando preclusa, comporta reconsideração”, isto é, reforma.

A falta de comunicação pelo agravante consiste em vício de regularidade formal do agravo de instrumento. Assim, se o agravado argüir e deixar suficientemente demonstrado que o agravante não comunicou a interposição do agravo na conformidade do caput do artigo 526 do CPC, o recurso não será admitido; caso contrário, o agravo poderá ser admitido. É preciso ter em mente que o agravo mesmo se o agravado não argüir e demonstrar a falta de comunicação poderá não ser admitido caso lhe falte algum dos pressupostos recursais.

Assim, na falta de comunicação pelo agravante ao juiz a quo da interposição de agravo de instrumento, ou mesmo na existência de comunicação, só que intempestiva, o juiz prolator da decisão interlocutória agravada não a poderá reformar e nem admitirá o recurso, desde que o agravado assim argua e demonstre com provas suficientes. Se o agravado permanecer inerte, a falta de comunicação por parte do agravante constituirá mera irregularidade, a qual não afeta a validade do ato processual, uma vez que a forma não é um fim em si mesma (GRINOVER, 2006, p. 21). Portanto, de se dizer que não poderá o juiz conhecer de ofício da irregularidade formal de que padece o agravo, devendo o agravado, no prazo de dez dias e no bojo de sua resposta, apresentar contra-razões, argüindo, inclusive, a falta de comunicação (BARBOSA MOREIRA, 2006, p. 513).

Cândido Rangel Dinamarco ensina que o parágrafo único do artigo 526 (CPC) “instituiu uma exceção em sentido estrito, conceituada esta como toda defesa que só pode ser conhecida pelo juiz quando houver sido objeto de alegação pelo interessado" (CARVALHO, 2004).

Assim, há uma distribuição de ônus: o agravante deverá comunicar o juiz a quo acerca da interposição do recurso no prazo de três dias, a fim de que ensejar juízo de retratação; o agravado, caso não tenha havido comunicação, passa a ter o ônus de argüir e comprovar (demonstrar com prova suficiente) a ausência de comunicação, o que importará em não-admissão do agravo de instrumento pelo juiz a quo (DIDIER JR.; CARNEIRO DA CUNHA, 2007, p. 140).

Quanto ao prazo para o agravado argüir e comprovar a irregularidade resolve esta questão a mera referência ao artigo 245 do CPC: “a nulidade dos atos deve ser alegada na primeira oportunidade em que couber à parte falar nos autos, sob pena de preclusão”. Assim, deverá o agravado fazê-lo no prazo de suas contra-razões.

Alexandre Freitas Câmara (2006, p. 113) defende o posicionamento ampliativo. E diz: “sendo a comunicação de interposição do agravo de instrumento destinada (também) a facilitar o exercício do direito de defesa do agravado, não nos parece razoável interpretar o texto legal como se o mesmo admitisse que a mera declaração de vontade do agravado, acompanhada da prova de que o fato alegado é verdadeiro, seja capaz de impedir o conhecimento do recurso. A nosso sentir, não se poderá deixar de conhecer do agravo de instrumento quando, não obstante o agravado tenha argüido e provado que a comunicação a que se refere o art. 526 do CPC não tenha sido feita, para ele não houver resultado qualquer prejuízo”.

O procedimento do recurso de agravo, sob a forma de instrumento, é o apresentado no seguinte fluxograma:

 

 

Da observação do fluxograma acima estabelecido e da redação do caput do artigo 527 do CPC, temos que recebido o agravo de instrumento no tribunal, deve-se proceder à sua imediata distribuição, mediante sorteio, a um desembargador-relator sorteado, o qual:

ü      Negar-lhe-á seguimento, liminarmente, nos seguintes casos: se o recurso for manifestamente inadmissível, for improcedente, estiver prejudicado ou estiver em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do STF, ou de Tribunal Superior. A posição predominante na doutrina é de que o inciso I, do artigo 527, do CPC, apenas remete ao caput do artigo 557 do CPC; minoritários aqueles que argúem que o referido inciso remete, também, ao parágrafo 1º-A do artigo 557 do CPC: posição, a priori, insustentável, haja vista que não será negado seguimento ao agravo de instrumento, e sim dado seguimento, de forma que seria uma hipótese que não se encontra prevista no artigo 527, I; a posteriori, a posição é sustentável, mas com fulcro no artigo 527, III, do CPC. Assim, para efeitos do artigo 527, I, o desembargador-relator pode inadmitir o recurso de agravo de instrumento.

ü      É obrigado (poder-dever) a converter o agravo de instrumento em agravo retido, nos casos em que não couber agravo de instrumento e este tiver sido a via recursal utilizada. Assim, procedida a conversão, os autos serão remetidos ao juízo a quo, de forma que se retenha o agravo aos autos e que se espere pela sentença e posterior reconhecimento de possível apelação.

ü      Reconhecerá do agravo de instrumento, desde que reconhecida a possibilidade de causar-se à parte lesão grave e de difícil reparação, atribuindo-lhe, somente nesse caso, efeito suspensivo. O artigo 558 do CPC deve ser observado: o desembargador-relator atribuirá o efeito suspensivo se comprovada a urgência e se requerido pelo agravante, sendo relevante uma fundamentação do pedido, de forma que, só assim, o cumprimento da decisão será suspenso até que ocorra o pronunciamento definitivo da Câmara Civil.

ü      Caso ache necessário, poderá requisitar informações ao juiz da causa, o qual as prestará no prazo de dez dias. As informações requisitadas não podem ser genéricas, de maneira que o desembargador-relator as determine; além disso, o juiz da causa deve se limitar à emissão de juízo de fato (narrativa) sobre as informações pedidas.

Note que os três primeiros pontos são auto-excludentes: nega-se seguimento ao agravo de instrumento, transforma-se-o em agravo retido ou reconhece-se-o. O quarto ponto traz uma possibilidade aplicável em concomitância aos três primeiros pontos.

Na mesma oportunidade em que decide pelo seguimento, ou não, ou pela conversão do agravo de instrumento, o desembargador-relator mandará intimar o agravado, na pessoa de seu advogado, para que responda, no prazo de dez dias, facultando-lhe a juntada de quaisquer documentos, mesmo que não constantes dos autos do processo principal. Tal resposta são as contra-razões ao agravo, e nestas é que ele deverá argüir e provar, se existente, a não-comunicação da interposição do agravo pelo agravante, sob pena de preclusão.

Depois de ultimadas as providências de reconhecimento do agravo de instrumento, requisição de informações e intimação do agravado, o desembargador-relator mandará ouvir o órgão do Ministério Público, se for o caso, para que se pronuncie no prazo de dez dias.

Em seguida, em prazo não superior a trinta dias da intimação do agravado, o desembargador-relator designará data para o julgamento em colegiado do agravo. Na sessão de julgamento, depois de o desembargador-relator ter feito exposição da causa, a Câmara Cível julgará (mediante sustentação oral) e, ao depois, o desembargador-relator proferirá o seu voto e, em seguida, os outros dois desembargadores votam.

Note que o artigo 529 (CPC) prevê que se o juízo a quo reconsiderar (proferir juízo positivo de retratação), antes do julgamento do recurso pelo tribunal, a sua decisão, o julgamento do agravo de instrumento no juízo ad quem faz com que o agravo reste prejudicado. Assim, o desembargador-relator deverá negar seguimento ao agravo (artigo 527, I, CPC), decisão esta recorrível mediante agravo interno interposto junto à Câmara Cível respectiva.

Atente-se para os recursos cabíveis contra a decisão do desembargador-relator. No caso de este negar seguimento, liminarmente, ao recurso de agravo, cabe o agravo interno para a Câmara Civil respectiva, no prazo de cinco dias. Na hipótese da conversão do ou de conhecer-se seguimento ao recurso, a decisão do desembargador-relator é irrecorrível – irrecorribilidade essa questionável, haja vista que os causídicos, na impossibilidade de aplicarem um recurso processual, fazem uso do remédio constitucional permitido pelo mandado de segurança, o qual é muito mais demorado, trabalhoso e custoso.

REFERÊNCIAS

ARRUDA ALVIM WAMBIER, Teresa Celina. Os agravos no CPC brasileiro. 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.

BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Comentários ao código de processo civil: volume V: arts. 476 a 565. 13ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.

CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil, volume II. 13ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2006.

CARVALHO, Fabiano. A conversão do agravo de instrumento em agravo retido na reforma do Código de Processo Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 428, 8 set. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5660>. Acesso em: 09 nov. 2006.

CHEIM JORGE, Flávio. A nova reforma processual. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003.

DIDIER JÚNIOR, Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Curso de Direito processual civil: volume 3: meios de impugnação às decisões judiciais e processo nos tribunais. 3ª ed. Salvador: JusPodivm, 2007.

GRINOVER, Ada Pellegrini; FERNANDES, Antonio Scarance; GOMES FILHO, Antonio Magalhães. As nulidades no processo penal. 9ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.

ORIONE NETO, Luiz. Recursos cíveis. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2006.

ZENKNER, Marcelo Barbosa de Castro. Aulas de Direito processual civil IV: proferidas de agosto a dezembro de 2006 e de fevereiro a julho de 2007 na Faculdade de Direito de Vitória (FDV).

 


 

* Bacharelando em Direito pela FDV

Editor da Panóptica – Revista Eletrônica Acadêmica de Direito

http://www.panoptica.org

julio@panoptica.org

 


 

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